sábado, 2 de maio de 2015

Playlist para vencer em qualquer relação


As relações, sobretudo as más, passam por estádios que podem ser comprovados cientificamente. Interessas-te por alguém, identificam-se em alguns níveis, namoram, discutem, casam ou juntam-se, discutem, separam-se e mostram ao outro que nunca estiveram tão bem.
Qual é que é a tónica comum nisto? O homem raramente abre a boca para dizer o que realmente sente. E a razão é muito simples: a mente de um homem é um buraco negro que não pode nem deve ser explorado. Se as mulheres soubessem o que vai na cabeça de cada um, a Humanidade terminaria nessa geração.
Há homens que se exprimem de várias formas: há os que batem, há os que são adúlteros, há os que bebem e há os que combinam os três anteriores. Porque é difícil viver com a cabeça de homem. E existo eu. Que crio playlists de música para dizer de forma subliminar o que sinto. Sou um DJ do relacionamento e ganho todas as discussões só a pressionar play. Meninos, este texto é para vocês e podem acompanhar com esta playlist.
Meninas, este texto também é para vocês. Se ouvirem alguma destas músicas, é porque a vossa cara metade está a insinuar algo.
#1 - Interpol "Obstacle 2"
Começar com uma música alternativa, para mostrar que não são como os outros e que só ouvem a RFM. Demonstram também interesse porque a música começa com "I'm gonna pull you in close
I'm gonna wrap you up tight" e é ao mesmo tempo fofinho e creepy.
#2 - Nick Cave "Into my arms"
Já andam no bem bom e têm uma música que atesta isso mesmo: ligação física e, vá lá, espiritual. No fundo, é chavascal que releva intimidade.
#3 - Bush "Swallowed"
O gajo envia a primeira dica: atenção que houve outra gaja antes de ti que fazia uma certa e determinada coisa como no título da música.
#4 - Air "Alpha Beta Gaga"
Sim, é muito giro ir à Zara e não me custa nada esperar pelas 30 gajas que estão à tua frente para experimentar calças nos bastidores. Agora, o que oiço sempre que falas é a letra completa desta música.
#5 - Mão Morta "Tu disseste"
Primeira discussão. Tu: toda cheia de sentimentos. Eu: factos. E terminamos num "diz que disse". E no fundo, como diz Adolfo Luxúria Canibal, o que é que interessa o que disseste? "Nada!"
#6 - Morphine "All wrong"
Primeira reconciliação. Há muito assentimento da minha parte, mas na minha cabeça estás errada em tudo. Porém, como vai haver bem bom, siga!
#7 - dEUS "Little arithmetics"
Sexo de reconciliação. Eu sei que tenho razão, mas deixo-me ir. E quem diz ir, pode muito bem dizer vir. No entanto, coloco uma musiquinha que faz lembrar a gaja anterior. E se fosses inteligente, vês que não é um tema que ouço normalmente e, ainda por cima, é daquele ano em que estive noivo de outra.
#8 - Nirvana "Breed"
Agenda totalmente preenchida e que apanha um jogo da Champions. Sim, é o aniversário de uma tia que gostas muito, mas se ouvires bem o Kurt, ele diz-te: "I don't care, I don't care, I don't care...." Ia lá perder um Barcelona-Real Madrid pelos 83 anos de uma gaja que não conheci durante dois terços da minha vida.
#9 - Rage Against the Machine "Killing in the name"
Lida da casa. "Trata da loiça e apanha a roupa do chão da casa de banho." Respondes: "Sim, claro" e pões só o finalzinho desta música. "Fuck you I won't do what they tell me. Motherfuckeeeeeer"
#10 - Ben Harper "Opression"
Apanhas a roupa do chão da casa de banho e com ela ao alto, dedicas a "Opression" à opressora.
#11 - Pink Floyd "Wish you were here"
Também vais lavar a loiça, mas ouves um clássico e pensas em alguém que gostasses que estivesse ali.
#12 - Led Zeppelin "Moby Dick"
Primeiros sinais de Verão. Pergunta-te: "Achas que o biquini ainda me fica bem?" E, para evitares 70 perguntas adicionais, caso digas a verdade, colocas uma música dedicada a uma baleia.
#13 - Red Hot Chilli Peppers "Californication"
Sucessão de discussões, dormes no sofá dois dias por semana e já não se passa nada há um mês. Vês a série Californication e sonhas ser Hank Moody como foste numa semana longínqua da queima, ao som deste tema dos Red Hot.
#14 - Kaiser Chiefs "Everyday I love you less and less"
Primeiras questões internas: "E se isto não continuasse?" A chegada a casa já não se faz com sorrisos, senão com preconceitos acompanhados com o pensamento:
Ela: "Deixa cá ver o que é que ele não fez desta vez.";
Ele: "Deixa cá ver com que é que ela vai embeiçar desta vez."
#15 - The Black Keys "Next girl"
Trata-se da época da catalogação. Vais percorrer os teus antigos contactos para ver quem poderá reacender a tua chama. Ainda não ganhaste coragem para acabar, mas não queres sair descalço.
#16 - Queens Of The Stone Age "Gonna leave you" ou Led Zeppelin "Babe I'm gonna leave you"
É o dia. Vais acabar tudo. Aqui, coloquei duas opções porque: caso tenhas fumado um cigarro alternativo com ervas mágicas, deves escolher a primeira; caso tenhas andado a beber, escolhe a segunda. É uma questão de eficácia.
#17 - The Doors "The end"
Acabou. Estás a arrumar as tuas cenas e tens um misto de emoções dentro de ti: alívio e "porra, tenho que reorganizar a minha coleção de cd's outra vez!".
#18 - Pearl Jam "Alive"
Primeira música que deves postar no Facebook depois de estares livre. Manda uma indireta e diz que estás pronto a estragar a vida de outra pessoa.
Mais sugestões?

quarta-feira, 29 de abril de 2015

O revolucionário gastrónomo

Hoje vou recuperar a história de João Saavedra Castro, o revolucionário gastrónomo.

João cresceu com a avó materna em Faldejães, perto de Ponte de Lima. Os seus pais morreram no cerco franquista de Toledo, em 1936, a combater ao lado dos republicanos, algo que só soube quando fez 16 anos.

Terá sido por isso que quis também ele fazer parte de algo maior, de lutar por uma ideia. Corria o ano de 1956, quando João decidiu ser revolucionário. Portugal não oferecia grandes oportunidades para esta saída profissional, mas João ouviu falar de Castro e Guevara, em luta contínua desde 53.

Rumou a Havana. Faltava ainda 3 anos para a revolução chegar à capital. Foi então que João optou por conhecer as particularidades locais, antes de começar a combater ao lado de Fidel e Che. E o que aconteceu a seguir mudou o rumo da sua vida. Apaixonou-se pelo 'boliche', um prato cubano que consiste num rolo de carne assado com arroz de caril. De barriga cheia, já não lhe apeteceu fazer nenhuma revolução.

No entanto, dizia aos amigos que tinha participado noutras. Tinha estado no levantamento militar argentino, em 1970, e no golpe de Estado de Pinochet, em 1973. E ganhou reputação no meio clandestino comunista português, como o 'che lusitano'. O que os comunistas não sabiam é que 'che' significava 'cheirinhas', o revolucionário que ia ao cheiro das iguarias de países revolucionários.


O verdadeiro choque ocorreu em 1974, quando João Saavedra publica o seu primeiro livro.
No prefácio, lia-se:
"Para que precisamos de ideias quando temos 'charquican'. Um guisado chileno comido em comunidade faz brotar uma fraternidade entre as pessoas, que deixa as ideologias à porta. Aliás, com um bom 'charquican' comido no El Perro Loco de Santiago, qualquer pessoa esquece fronteiras, porque todos querem viver ali."

O livro "Adie-se a revolução porque estou a fazer a digestão" conheceu 7 edições em França e 3 em Portugal, sendo que uma delas foi adquirida pelo Comité Central do Partido Comunista Português, para uma queima pública, que decorreu na 2ª edição da Festa do Avante.

terça-feira, 28 de abril de 2015

Discussões em casal

As discussões com a minha mulher começam sempre por más interpretações. Ela coloca o foco que não é de todo o meu.
Ora vejam os últimos exemplos.
#1 
Eu: "Sempre que apago o histórico da internet fico sem som no computador. Estranho, não é?
Trata-se de uma questão técnica. Eu preciso de som no computador. E ela foca na questão do histórico.
#2
Eu: "A Sandra tem uns mamilos mais rosados do que os teus. Já reparaste?"
Cá está! Uma preocupação séria de como manter uma cor que se vai esbatendo com a idade. E ela a insistir não sei quê e não sei que mais acerca lá da melhor amiga.
#3
Ela: "Agora estás a ser criança!"
Pelo vistos isto pretende ser um insulto, mas eu vejo como um elogio. Porque as crianças são como o Cristiano Ronaldo: o melhor do mundo. Mas ela também não percebe nada de futebol.

domingo, 26 de abril de 2015

Abílio Pires, o homem que fez a revolução

No dia a seguir aos 41 anos do 25 de Abril, também Abílio Pires comemora 41 anos de casamento.
Quem é Abílio Pires?, perguntarão alguns de vocês.
Abílio Pires fazia parte do Gabinete de Identificação da PIDE e na noite de 24 para 25 de Abril não soube de nenhuma revolução. Mesmo assim, ainda hoje pensa que foi ele quem a provocou.
Na manhã do dia 24, Abílio foi chamado para investigar uma afluência anómala de pessoa à serra de Sintra. A PIDE tinha nos seus relatórios que esse era um dos locais prediletos de reuniões secretas comunistas e onde Álvaro Cunhal se havia reunido com Santiago Carrillo, líder comunista espanhol.
Chegou ao local sozinho e encontrou uma cabana abandonada, mas ainda com a chaminé a fumegar. Em vez de retornar a Lisboa, decidiu ficar por ali. Qual lobo mau da história do Capuchinho Vermelho, deitou-se na cama. Nem uma hora havia passado, quando entra na cabana uma pessoa. Era Helena Costa.
Helena era uma conhecida comunista, procurada pela PIDE. Entre 1961 e 1966 esteve na Índia, na célula comunista de Jaipur. E foi por isso que Abílio não a prendeu.
Abílio defendia o Estado Novo como qualquer banal fanático. Porém, acima de Deus, Pátria e Família e Salazar, Abílio defendia os Beatles. Tinhas os discos todos, mesmo os subversivos. Preferia o George Harrison e o seu disco preferido era o Rubber Soul. Este álbum tinha nascido da influência crescente da música indiana em George Harrison e isso intrigava-o, sobretudo, porque sentia uma ligação espiritual com o autor de "Think for yourself", a música que Abílio pensava ser sobre si.
À tensão inicial sobreveio um diálogo ameno. Helena sentia-se comunista apenas no combate pela liberdade e Abílio sentia-se fascista apenas no combate que não queria fazer contra si. Helena falou-lhe da Índia e falou-lhe de plurais:
- Não há uma Índia, há Índias. E a melhor de todas é que constróis dentro de ti. Eu tenho a minha, à qual pretendo regressar.
Não se sabe se foi por manipulação, se por amor à primeira vista, mas Abílio e Helena fizeram amor naquele dia até ser noite e dia outra vez. A formação comunista de Jaipur incluía aulas intensivas de prática de Kama Sutra, a forma que consideravam mais eficaz para virar fascistas em comunistas. E assim aconteceu.
Abílio levantou-se no dia seguinte com vontade de abandonar a PIDE e de dizer a toda a gente a liberdade está na flexibilidade de uma comunista dotada das artes do Kama Sutra. Ele não o disse assim. Dizia apenas que era amor.
Quando chegou a Lisboa, não se sentiu surpreendido por ver aquela gente toda na rua. Pensou apenas que aquele sentimento que tinha dentro dele era tão grande, que só podia ter extravasado para outros. E agora ali estavam, porque queriam uma comunista tão dotada como Helena. (É ele que está na foto, atrás de Salgueiro Maia)
Não casaram a 25, porque o registo civil estava fechado. Casaram no dia seguinte. Hoje, Domingo, celebram 41 anos de casados. Vivem há 36 em Goa e ouvem neste dia o Rubber Soul de fio a pavio. Helena nunca lhe disse quem é o seu Beatle preferido.