sexta-feira, 12 de abril de 2013

Empresa que ajuda empresas

Modelo de negócio 1:
Empresa que ajuda empresas a ajudar outras empresas que não sabiam que precisavam de ajuda.

Modelo de negócio 2:
Empresa especializa-se em dotar o vocabulário de gestores de jargão quotidiano, sempre terminado em -ing. Sedia-se em Chuang Sei-Tao num antigo palácio da dinastia Ming.

Exemplos:

1: Versão normal: Vou tomar café.
1: Versão inguing: Vou ao catalisadoring do cagueiring.

2. Versão normal: Esta D. Graça não dá uma para a caixa: nem sabe tirar o pó, nem limpar o chão. E quanto mais a aviso, menos ela percebe. Nem sei que lhe faça.
2. Versão inguing: Esta D. Graça tem umas skills de merding para o multitasking. Raport e networking é pró tecting. Só mesmo à estalading.

Especializado em especialização

- O que é que o teu pai faz?
- É cientista.
- Ai, sim? E cientista de quê?
- É... mmm... cientista de ciências e coiso.
- Mas o que é que ele faz especificamente?
- Trabalha para a Danone.
- Ah, bom! Então é cientista de iogurtes, é isso?
- Também. Ele começou nos iogurtes e agora especializou-se noutra coisa.
- Noutra coisa como? Iogurtes líquidos?
- Não. Intestinos.
- Hã?!
- É o inventor do Bioactivo, o que regula o trânsito intestinal.
- Ah, então é cientista?

Seis meses antes, no laboratório que inventou a regulação, na reunião semanal de tempestade de cérebros.
- Ora então, meus senhores: ideias precisam-se! Quem quer começar? Fonseca?
-  Sim, Mestre Regulador. Olhe, para esta semana lembrei-me que podíamos desenvolver esta ideia: REGULAÇÃO DE GAJAS BOAS. Até tenho aqui um quadro com níveis de qualidade de gaj...
- Ó homem, pelo amor de...
- ... até já preparei um dos laboratórios para testá-las. Está todo em veludo, com muito requinte.
- Cale-se! Eu não sei como é que você continua aqui?! Já não me basta termos avançado com a sua ideia de regulação financeira, que esbardalhou meia dúzia de países. Ó Nossa Senhora da Regulação! Adiante. Quem mais tem ideias?
- Eu, Mestre Regulador.
- Avance, Gregório.
- Ok.
- Ok, o quê?
- Ok, vou avançar.
- Ok, vou avançar, o quê?
- Ah, sim, desculpe. Ok, Mestre Regulador.
- E...?
- O beijo na boca, já me esquecia.
Chuaque.
- Avancemos. Estava a dizer...
- Lembrei-me que podíamos regular o trânsito intestinal.
- Pronto. Hoje está tudo perdido! Que raio de ideia é essa?
- Então...
- Espere lá, Gregório. Vamos por partes: primeiro, como é que o senhor parte para uma área de saber específica sem dominar a área geral?
- Como assim?
- Para perceber de fracturas do cúbito tem antes que entender medicina geral. Conhecimento geral antes do conhecimento específico! É preciso todo um consentimento... um conhecimento, queria eu dizer, para poder chegar ao intestino. Em segundo lugar, por que não regulação do trânsito das trompas de falópio? Ou das mucosas nasais? E por último: como é que se executa essa regulação?
- Com iogurte.
Risada geral.
- Calma, gente. Vamos fazer assim, que estou a ver que esta semana é só disto: vamos avançar com esta ideia. Mas antes de irmos ao intestino, vamos ver se resulta no geral. Fonseca, Gregório e Antunes, esta semana vão tentar regular o trânsito.
- O trânsito quê?
- O trânsito. Pegam em boiões de iogurte e vão barrar o IC19.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

O escritor de policiais que matou o protagonista à segunda página

Ideia para colecção de 10 livros tipo Poirot.

Enredo:
Toriop, ex-agente secreto - percepção Sherlock, voz de barítono Nero Wolfe, paladar Pepe Carvalho e pantufas Maigret -, é chamado para investigar o assassinato dos sonhos das pessoas que têm filhos, em Paramos.
Acontece que tropeça numa vírgula mal posta pelo narrador e parte o pescoço no primeiro hífen da palavra 'fim-de-semana'. O escritor é Adventista dos Assassinos do 7º dia do Acordo Ortográfico.
Tudo isto ocorre à segunda página e o assassino termina o livro incólume, pois o escritor está devastado pela morte do herói por um erro gramatical.
Toriop não mais entra nos livros seguintes, onde assistimos ao crescimento da onda de crime até aos limites do apocalipse, sendo que o décimo livro termina com um capítulo em branco, uma vez que o escritor se suicida por obesidade da consciência.

Alvíssara gastronómica

O Javali de Vladivostok já tem estaminé para encher o... bandulho.
Numa perspectiva de nicho, anuncia a abertura do primeiro Sushi Gay.
Promoção de abertura:
5€ = 20 piças


As gajas que lêem Tolstói dão-me tusa

Enredo:
Um gajo (solteiro ou casado, depois decido) percorre o corredor da ficção estrangeira da mesma livraria (real ou imaginária?) todos os dias.
Finge percorrer os autores de policiais estrangeiros, enquanto mantém os livros de Tolstói ao alcance dum soslaio.
Sempre que uma gaja pega num livro do autor, ele enquadra-a no kama sutra consoante o título:
1. Kadji-Murat = felácio
2. Cossacos = rapidinha no WC
3. Morte de Ivan Ilitch = jantar com rambóia no motel
4. Anna Karénina = beijos sensíveis com ligeiro roço e canzana para terminar
5. Guerra e Paz = fim de semana com meia-pensão na Curia e fazer amor (nada de sexo) à luz das velas, antes de incendiar o hotel, pois é demasiado caro para o bolso do gajo.
Depois de vários episódios imaginados pelo gajo, há uma gaja que o interpela, conduzindo-os ao banco traseiro do Seat Ibiza do gajo, num encontro que dura quase um minuto inteiro.
A gaja usa adjectivos para descrever o acto que o gajo prontamente rejeita, pois acha que não são literariamente dignos de uma gaja que lê Tolstói.
Numa breve reflexão, que não ultrapassará mais do que as palavras que estou a escrever, o gajo pensa por momentos que não sabe se ficou indignado com os adjectivos ou com a sua performance no bólide.
Decide que ficou indignado com os adjectivos.
Muda de rumo.
Começa a engatar gajas que lêem As Cinquentas Sombras de Grey, coadunando os adjectivos às práticas de leitura.

Delfins e capitalismo

Alexander Rüstow é o elo perdido. Ou não.
Não deve ser, pois não deixou descendência.
O quê? Deixou! Então descurou a educação dos filhos.

Alexander Rüstow, forjador alemão, apoderou-se do estado natural do mundo. Foi fanfarrão. Despersonalizou o Estado naquilo que personaliza originalmente os nasciturnos. O que se pretende dizer, como é óbvio, é que plasmou o termo 'neoliberalismo'.

O que pretendeu Alexander Rüstow não foi original, pois a nova ideia implicava parapsicologia: implicava regressão.
Está provado que o capitalismo é um estado selvagem. Por quem? Por várias pessoas que citarão este artigo depois de concordarem efusivamente e, inclusive, se indignarem prontamente (com laivos de fúria) em sede própria: normalmente no Facebook.
O capitalismo é um estado selvagem.
Quando vou a casa da minha irmã, o meu filho olha para os brinquedos do primo e diz: "É meu!"
Quando ingressa no infantário, o meu filho olha para os brinquedos expostos e diz: "É meu!" (São vários os brinquedos mas ele desconhece ainda o plural, porque é um pouco estúpido. O pediatra diz que está no estado normal de evolução verbal, mas o pediatra é estúpido).
O que sucede é que perante objectos que não constam no seu catálogo, a criança mostra naturalmente uma apetência pela ditadura da propriedade privada (embrulha, John Locke).

A base do capitalismo está na propriedade privada.
As crianças só conhecem a propriedade privada.
As crianças são selvagens.
Logo, o capitalismo é selvagem.

Até aqui tudo bem. Trata-se de uma ideia que não me causou qualquer comichão entre a sua nascença, em 1938, e 1990.
Nesse ano, uma calamidade assolou o mundo e impeliu-me, primeiro, a pensar várias vezes ao dia (até aqui só o fazia às 2ªs entre as 15 e as 16) e, depois, a intervir. Havia que combater o capitalismo, esse estado selvagem.
Em 1990, a BMG (infâme) lança o seu primeiro disco de uma banda portuguesa, intitulado "Desalinhados". A banda que actuaria nesse ano perante 50 000 pessoas, na primeira parte da Tina Turner, esbardalhava nesse álbum uma música dos Roxy Music e dava a conhecer-se com o tema "Nasce Selvagem". O seu nome: Delfins.
Nesse ano, tornei-me colectivista por oposição aos Delfins. Por inerência, por oposição ao capitalismo selvagem.

Ora, se é verdade que a canalha quer tudo só para si, também é verdade que pais e educadores combatem naturalmente a ideia inata de propriedade privada, com uma educação assente em fraternidade e colectividade.
"- Anda lá, Mário Miguel, empresta lá a barbie à Rafaela. Também gostas que ela te empreste os barriguitas, não gostas?" (Era escusado esse comentário, mas o meu filho tem os brinquedos que quer e usa sempre cuecas com o Pluto desenhado, pois acha piada que o cão lhe possa comer a salsicha durante a noite - têm cá uma imaginação, estes malandros!)
Serve esta ideia para mostrar que a conversão do estado selvagem para o civilizado ocorre pela educação. A educação como ritual de passagem entre capitalista e colectivista: entre idiota egoísta e lindo menino.
Se os pais combatem o egoísmo, por que razão aceitamos que nos digam que é bom - que é normal - ser um adulto egoista?
Por que razão se diz que existe evolução genética, mas não existe evolução do meio?
Para quê haver escola, se esta é um mero oásis entre estado selvagem pré-escolar e regressão ao estado selvagem pós-escolar?
Façamos como Alexander Rüstow e não eduquemos as nossas crianças, mantenhamo-las no estado natural.
Melhor: levemos o egoísmo ao extremo e não tenhamos crianças.

A BMG já não se encontra entre nós. Nem tudo são más notícias.
O mesmo não se pode dizer dos Delfins.