quarta-feira, 19 de março de 2014

Tudo de bom



Indignação #381: Pessoas que desejam “Tudo de bom!”

Sempre que alguém me diz “Tudo de bom” fico furioso. É que eu não sei se existe da parte do outro desconhecimento ou deliberação. Antes que apareça nos jornais por algum acto violento, queria explicar a razão da fúria.
Desejar algo de bom a alguém não é mau: é bom. Agora desejar ‘tudo’ de bom não é mau: é péssimo. É relegar uma pessoa para uma monotonia de coisas boas. Desejar ‘Bom’ a alguém é desejar mais do que ‘Suficiente’ e menos do que ‘Muito Bom’. ‘Excelente’, nem pensar!
Ora, atribui uma classificação quem está na posse da tabela de avaliação. E a pessoa que o faz tem na sua posse o ‘Mau’, o ‘Medíocre’, o ‘Suficiente’, o ‘Bom’, o ‘Muito Bom’ e o ‘Excelente’. O ‘Mau’ e o ‘Medíocre’ é aquilo que é desejado nas nossas costas, logo, é uma classificação muda para o visado.
O ‘Suficiente’ é um conceito exclusivo dos avós que, como são doutro tempo, utilizam a expressão ‘Pelo menos’ como sinónimo de ‘Suficiente:
- Olha avó, já viste como ficou o meu coto depois do acidente lá na fábrica?
- Pois é! Que desgraça! Pelo menos, ainda tens trabalho.
Entramos na grande questão: o ‘Tudo de Bom’. No caso das pessoas que o fazem deliberadamente, estas gostam de classificar todos os aspectos da nossa vida como ‘boas’. Aliás, não classificam: profetizam. Desejam que, a partir do momento em que nos despedimos delas, a nossa vida futura tenha tudo de bom. O ‘Tudo de Muito Bom’ ou ‘Tudo de Excelente’ reservam para elas e hipotecam as nossas possibilidades de almejar tais propósitos.
Há momentos íntimos com a minha mulher que duram segundos (às vezes um minuto inteiro) que eu considero excelentes e que, segundo ela, são apenas medíocres. Ok, a média dá bom, mas eu acho que ela está a mentir.
Existe também quem emprega a expressão com desconhecimento. Pensa que ‘Bom’ é o máximo que se pode atribuir. Veja-se o que diz um amigo meu:
- Epá! Olha só para aquela. É toda ‘Boa’!
Eu replico:
- Calma lá, Ricardo! Toda, não! Tem uns bons quadris, quanto muito. Os lábios são suficientes. A amplitude dos ombros é medíocre. Já as glândulas mamárias são excelentes.
- Vai-te f*****, Bruno!
Cá está! As pessoas reagem mal à sua ignorância, ao desconhecimento do problema.
O que proponho é o seguinte: sejam específicos e sinceros. Eis alguns exemplos, quando se despedem de amigos:
- Gostei razoavelmente de te ver. Desejo-te três coisas suficientes para a tua vida profissional e uma boa vida em duas variantes ao lado da tua esposa medíocre.
- Acho excelente a ideia de emigrares. Seria péssimo para mim ter que fazer conversa sempre que nos encontrássemos. É que conhecemo-nos mediocremente.
- Até breve! Olha: 27% de coisas boas para os teus filhos, 13% de coisas suficientes para a tua relação e 8% de coisas péssimas para o teu trabalho.
Como eu não sei quem leu isto e fazendo médias e desvios padrões, desejo-vos: Tudo de bom!